sábado, 28 de agosto de 2010

Pensamento Anacrônico


Pensamento retrógrado, antiquado.
Denominar assim a própria linha de raciocínio pode parecer uma lógica saudosista e denotar um certo desinteresse ao moderno, ao novo, àquilo que vivenciamos a cada dia, até mesmo sem nos darmos conta. Parece ainda, esquivar-se das novas tendências e vislumbrar o mundo com os olhos daqueles que já se foram ou, mesmo, temer o futuro incerto que se descortina a nossa frente.
Mas antes dessa análise do que seria um pensamento anacrônico, deve-se ter em mente o que vem a ser a idéia do pensamento moderno, restrita a certos aspectos que nos interessa definir aqui.
Diante desse desafio que é o de delimitar o que é o moderno, deparamo-nos com situações quotidianas que ilustram exatamente o medo daqueles que se apegam ao pensamento retrógrado como base de um sistema de vida e interação com o meio, e ao referir-se a esse pensamento deve-se ater-se a certos aspectos delimitados e que obviamente distanciam-se de uma generalidade de ideias, a qual nos levaria a retrocessos no que tange a vida em sociedade e à própria qualidade de vida.
Tomemos como o exemplo a família moderna:
Impulsionada pela sociedade consumista e desprovida de valores, a cada dia a família perde o seu espaço na formação da personalidade do indivíduo e consequentemente cria certas dificuldades ao mundo moderno que não eram percebidas a tempos atrás. O trabalho como base não para uma satisfação plena e sim para uma deteriorada ideia capitalista de consumo exacerbado tem alienado o indivíduo moderno, transformando-o em escravo de seus desejos consumistas. Hoje, as crianças crescem em escolas, rodeadas de toda uma cultura pedagógica, que por trás de seu aspecto educador evidencia a tendência terceirizadora, como a vista inicialmente no ramo empresarial e, hoje, presente na formação da identidade de uma nova geração. Perde-se a figura da família e a cada dia nos reconhecemos menos como membros da primeira ideia de sociedade, o núcleo basilar do Estado, que desde os primórdios da humanidade tem sido nosso refúgio nos momentos difíceis, de tristeza, assim como naqueles de alegria, de realização, e que ao perdê-lo, vemos crescer mais e mais a figura dos analistas, psicólogos e até mesmo de grupos e livros de auto-ajuda, o que talvez explicaria a tomada do espaço familiar pela famigerada mídia, que entra em nossos lares e faz-nos ver nossas vidas reais como monótonas e desinteressantes, levando-nos a transferir aos agentes do entretenimento, sobretudo o televisivo, nossas aspirações; transfigurar nos galãs musculosos e nas mulheres de corpos "perfeitos" e desprovidas de "interesse intelectual" nossas vidas medíocres; e assim, nossos filhos crescem, rodeados  de exemplos de como se deve conduzir suas vidas, baseando-se nos valores econômicos e na imagem estética estereotipada.
De acordo com tal pensamento moderno devemos aceitar os desmandos de uma sociedade desregrada, axiologicamente pobre, que prega um ser humano, que seria aos olhos anacrônicos dos descontentes com a nova realidade, membro de uma sociedade apodrecida e jogada aos desejos mais fúteis.
Como dizem os mesmos agentes do entretenimento das grandes mídias através de seu sensacionalismo capitalista: "A vida humana nunca valeu tão pouco!". E é por essa típica frase feita, tão vivificada nos dias de hoje que podemos expressar nossos pezares pelos tempos que já se foram.
Criamos nossos próprios monstros e nos armamos de ofendículos e desculpas inúteis.
Talvez o pensamento anacrônico seja a solução para o mundo que criamos e que, paradoxalmente, tem nos destruido.

2 comentários:

  1. O que percebemos é uma real tendência da sociedade "moderna" em projetar nas outras pessoas aquilo que queriam ser. Os valores foram distorcidos, como se tudo resolvesse em uma "passe de mágica", tudo aprendido, a muito custo, através dos ensinamentos sábios da midia televisiva. As pessoas não conseguem enxergar o outro a sua frente. Na verdade o que é real é aquilo que é fantasiado e a verdadeira realidade é suprimida e asfixiada a cada esquina e beco das metrópoles.
    O pensamento retrógado, taxado por muitos como antiquado, não pode ser afirmado como a inexorável solução para esta crise de identidade que vivemos, mas a história nos mostra que revisitar o passado é sempre um bom caminho para se tentar resolver os conflitos existentes.
    A frase citada no texto "A vida humana nunca valeu tão pouco", é de uma atualidade e de uma verdade tão absurda, que fica até dificil de crer que conseguimos viver em tal condição.
    Parabéns pelo texto Eder, estou ancioso para ler os próximos.
    Abs.

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